21 de novembro de 2010

Com olhos de ver

"Ainda sou do tempo…” – já dizia a outra senhora – em que o intervalo entre épocas festivas era notório e notado! Como posso vir a ter o dito “espírito natalício” se antes de São Martinho já as montras e ruas estão com enfeites de Natal?! Onde está o factor surpresa? Acham que é isso que vai apelar às compras? Antes pelo contrário, satura, chateia e ao invés do resultado pretendido dá tempo para adquirir os materiais necessários e, até à noite de Natal, como bom “tuga”, improvisar e reproduzir o que se viu numa montra. Ainda sou do tempo em que a corrida aos saldos fazia parte das nossas vidas, no final de cada época. Agora, nunca percebemos muito bem a diferença entre as promoções ao longo do ano e os saldos – e só muda o nome! Das decorações de halloween (mais um estrangeirismo consumista), muda-se para o Natal. A seguir para o dia dos namorados (só se namora nesse dia?!), o consumismo apela aos dias da mãe e do pai. As máscaras de Carnaval são substituídas pelos ovos e coelhos da Páscoa, e por aí fora! Uma chatice! Não querendo ser saudosista, deixem que vos diga que tenho saudades de várias coisas, como o cheiro do musgo e da terra molhada das Beiras; da fruta sazonal cujo sabor era intenso; tenho saudades do pão torrado à lareira, nas noites frias, com a minha avó e das traquinices dos meus irmãos quando pequenos. Tenho saudades de ouvir a minha mãe cantar e da rara mas sonora gargalhada do meu pai. Tenho saudades de toda a azáfama de uma vindima, da apanha da azeitona, do cheiro e sabor do azeite quente ainda no lagar. Tenho saudades do iogurtes feitos pela minha mãe, numa iogurteira em plástico castanho, qual Bimby dos anos setenta! Tenho saudades de refeições bem confeccionadas e de tempo para as degustar. Tenho imensas saudades dos amigos que partiram e aos quais nem sempre arranjei tempo para lhes dizer o quanto gostava deles e eram importantes para mim… Tempo… Tenho saudades de poder ter tempo. E olhando para tudo isto COM OLHOS DE VER, o meu maior receio é não ter saudades de ter saudade."
 
Paula Martin da Silva

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